quinta-feira, 25 de abril de 2024

ELAS NA POLÍTICA > Pré-candidatas à Prefeitura Municipal de Aracaju-SE.





Yandra Moura (União Brasil)

Katarina Feitoza (PSD)

Danielle Garcia (MDB)

Candisse Carvalho (PT)

Niully Campos (PSOL)

Emília Corrêa (PL)

Eleições 2024: veja quem são os pré-candidatos à Prefeitura de Aracaju

Eleições 2024: veja quem são os pré-candidatos à Prefeitura de Aracaju

Candisse Carvalho (PT)

Danielle Garcia (MDB)

Emília Corrêa (PL)

Fabiano Oliveira (PP)

José Paulo Leão Veloso Silva (Novo)

Katarina Feitoza (PSD)

Luiz Roberto (PDT)

Niully Campos (PSOL)

Yandra Moura (União Brasil)

Publicação compartilhada do site G1 GLOBO SE., de 25 de abril de 2024 

Eleições 2024: veja quem são os pré-candidatos à Prefeitura de Aracaju

Segundo a legislação eleitoral, os nomes devem ser confirmados durante as convenções, que ocorrem entre 20 de julho e 5 de agosto.

Por g1 SE.

As mulheres são maioria entre os pré-candidatos à Prefeitura de Aracaju. Faltando cerca de seis meses para a as Eleições 2024, os nomes ainda serão confirmados durante o período das convenções eleitorais, entre 20 de julho e 5 de agosto.

Confira, em ordem alfabética, os nove nomes que devem entrar na disputa.

Candisse Carvalho (PT) - Foto: Arquivo Pessoal

Candisse Carvalho é jornalista de formação. Em 2023, assumiu a assessoria especial do Ministério do Desenvolvimento Social, Assistência, Família e Combate à Fome. Essa é a primeira vez que coloca o nome à disposição da disputa eleitoral.

Danielle Garcia (MDB) - secretária de Políticas para Mulheres de Sergipe — Foto: ASN /Arquivo

Danielle Garcia é formada em direito pela Universidade Federal de Sergipe e delegada. Foi diretora do Departamento de Combate a Crimes contra a Ordem Tributária e à Administração Pública (Deotap/SE), coordenou em Sergipe o Laboratório de Tecnologia no Combate à Lavagem de Dinheiro, fez parte da equipe de Departamento de Recuperação de Ativos e Cooperação Jurídica Internacional do Ministério da Justiça (DRCI/SNJ) e foi instrutora em cursos promovidos pela Secretaria Nacional de Segurança Pública (Senasp), vinculada ao Ministério da Justiça. Atualmente comanda a Secretaria de Estado da Mulher de Sergipe.

Emília Corrêa (PL) - Emília Corrêa - vereadora de Aracaju — Foto: Gilton Andrade

Emília Corrêa é advogada, defensora pública aposentada, comunicadora de rádio e TV e vereadora por Aracaju em seu 2º mandato. No início do mês de abril, ela deixou o partido PRD e se filiou ao PL, onde pretende se candidatar à Prefeitura de Aracaju .

Fabiano Oliveira (PP) - Fabiano Oliveira, vereador de Aracaju — Foto: Arquivo Pessoal

Fabiano Oliveira é empresário e comunicador, foi deputado estadual e atuou na área do turismo no Governo de Sergipe. Atualmente, é vereador de Aracaju.

José Paulo Leão Veloso Silva (Novo) - José Paulo Leão Veloso Silva (Novo) — Foto: Arquivo Pessoal

José Paulo é procurador do estado de Sergipe desde 1998, advogado especialista na área tributária. Já foi delegado da Polícia Federal, tendo servido na superintendência do Amazonas, onde chefiou a Delegacia de Combate aos Crimes Ambientais e contra o Patrimônio Histórico. Ele foi anunciado pelo Novo como sendo o pré-candidato à Prefeitura de Aracaju.

Katarina Feitoza (PSD) - Katarina Feitoza, deputada federal — Foto: Anderson Barbosa/g1/Arquivo

Katarina Feitoza é formada em Direito pela Universidade Tiradentes, é delegada de Polícia Civil de Sergipe e assumiu como Delegada Geral em 2010. Em 2020, foi eleita vice-prefeita e, em 2022, como deputada federal.

Luiz Roberto (PDT) - Luiz Roberto - secretário da Sedurbi — Foto: Arquivo pessoal

Luiz Roberto é advogado, formado pela Universidade Federal de Sergipe, foi servidor público no Ministério da Fazenda e aposentado pela Petrobras. Na administração municipal de Aracaju, foi presidente da Fundação Municipal de Formação Para o Trabalho (Fundat) e presidente da Empresa Municipal de Serviços Urbanos (Emsurb). Atualmente é secretário de Estado do Desenvolvimento Urbano e Infraestrutura (Sedurbi).

Niully Campos (PSOL) -  Niully Campos — Foto: Leandro da Graça/TV Sergipe/arquivo

Niully Campos é advogada e professora, mas nunca ocupou cargos públicos. Em 2016, disputou eleições para vereadora de Aracaju; em 2018, disputou para deputada estadual e, em 2022, concorreu ao governo do estado.

Yandra Moura (União Brasil) - Yandra Moura — Foto: Reprodução/TV Sergipe

Yandra Moura é advogada, graduada em direito pela Universidade Tiradentes. Disputou pela primeira vez uma eleição em 2022 e foi eleita como deputada federal.

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Texto e imagens reproduzidos do site: g1 globo com/se/sergipe

quarta-feira, 24 de abril de 2024

60 Anos do Golpe de 1964

Artigo compartilhado do site SÓ SERGIPE, de 30 de março de 2024

60 Anos do Golpe de 1964: Um passado que jamais deve ser esquecido
Por Jorge Santana *

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 Como beber dessa bebida amarga

Tragar a dor, engolir a labuta

Mesmo calada a boca, resta o peito

Silêncio na cidade não se escuta”

(Cálice, Chico e Gil)

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Este 31 de março de 2024 marca os 60 anos do abjeto golpe civil-militar de 1964, que se prolongou por longos 21 anos de uma ditadura perversa e sombria, razão pela qual torna-se crucial relembrar para evitar seu apagamento da memória coletiva do Brasil. É fundamental que as gerações mais velhas recordem e que os jovens aprendam o que realmente significou esse triste período, especialmente quando forças da extrema-direita ousam emergir do lixo da história e atrevem-se a tentar reescrever esse capítulo obsceno do nosso passado.

O ano de 1964 foi palco de um dos momentos mais críticos da história brasileira. Um período marcado pela instabilidade política e social, com crescentes tensões entre as classes conservadoras e os setores progressistas. A conjuntura era de medo e incerteza, com a ameaça comunista sendo amplamente propagada pelas forças do atraso como justificativa para ações radicais.

Não se pode ignorar o papel central desempenhado pelas elites econômicas, pela classe média conservadora, pela mídia de grande escala e por parte da Igreja Católica no incentivo e na legitimação do golpe. Esses setores, temendo a perda de seus privilégios e influência sob um governo de esquerda, mobilizaram-se intensamente, pintando o golpe como uma necessidade para a preservação da ordem e da família brasileira.

O regime militar, instaurado pós-golpe, caracterizou-se pela supressão das liberdades democráticas, a instituição de uma farsa institucional que se mantinha por meio do medo, da perseguição, da tortura e da morte de opositores. A repressão brutal e sem limites tornou-se a marca do regime, com inúmeros casos de sórdidas violações de direitos humanos.

Por outro lado, a ideia de que a corrupção é um mal dos regimes democráticos é desfeita ao lembrarmos dos escândalos que permearam a ditadura, muitos dos quais jamais vieram a público devido à censura imposta à imprensa. Projetos megalomaníacos, desvios de verbas e enriquecimento ilícito de militares e aliados ocorreram longe dos olhos da sociedade.

É uma falácia acreditar que o Brasil, sob a ditadura, era um país de prosperidade e segurança para todos. O crescimento econômico desse período beneficiou uma parcela ínfima da população, enquanto a maioria enfrentava a repressão, a falta de liberdade e a desigualdade social crescente.

O golpe de 1964 e o regime ditatorial que se seguiu representam um dos capítulos mais tristes e vergonhosos da história brasileira. É imperativo lembrar e ensinar sobre esse período não apenas como um ato de resistência contra a tentativa de revisionismo histórico, mas também como um alerta.

A tentativa de golpe de 8 de janeiro de 2023 nos lembra da fragilidade da nossa democracia e da constante ameaça que as forças autoritárias representam. Jamais podemos esquecer, para que quando ousarem tentar repetir, sejam derrotados e severamente punidos.

Na promulgação da Constituição Cidadã de 1988, Ulysses Guimarães fez um célebre discurso que entrou para a história e que deve estar sempre presente nas mentes e corações dos verdadeiros democratas:

“Traidor da Constituição é traidor da pátria. Conhecemos o caminho maldito. Rasgaram a Constituição, trancaram as portas do Parlamento, garrotearam as liberdades, mandaram os patriotas para a cadeia, o exílio e o cemitério. (…) Temos ódio à ditadura, ódio e nojo. Amaldiçoamos a tirania, onde quer que ela desgrace homens e nações”.

DITADURA NUNCA MAIS!

* Sobre Jorge Santana - Jorge Santana é ativista pró-democracia.

Texto e imagem reproduzidos do site: www sosergipe com br

terça-feira, 23 de abril de 2024

'A Proximidade de uma guerra absurda', por Fernando Gabeira

Artigo compartilhado do site do GABEIRA, de 22 de abril de 2024

A Proximidade de uma guerra absurda 
Por Fernando Gabeira (in blog)

A tensão entre Israel e Irã nos mantém alertas não apenas sobre a possibilidade de um conflito regional, mas de algo muito mais amplo, que envolva toda a humanidade.

Neste momento, considero muito interessante a reflexão do escritor Amin Maalouf no livro recém-lançado no Brasil “O labirinto dos desgarrados, o Ocidente e seus adversários” (Editora Vestígio, 332 páginas). Ele não é cientista político nem estrategista. É um escritor que não só tem coragem de afirmar o absurdo da guerra, como de devolver as qualificações de romântico ou ingênuo atribuídas aos que a consideram inevitável.

Creio que Maalouf, nascido no Líbano e vivendo na França, tem muitas razões para refletir bem sobre o Ocidente. Ele escreveu um livro sobre as Cruzadas mostrando como, nas Cruzadas, os europeus comiam crianças muçulmanas no espeto. Ele conhece também todos os horrores da colonização europeia na África, Ásia e em todos os outros lugares por onde ela se instalou. Mas seu conhecimento da História mostra também que o ódio sistemático ao Ocidente acaba desviando para a barbárie e para a autopunição.

Na comparação entre as duas guerras frias, a que terminou com o fim do Império Soviético e a atual, Maalouf compreende bem que países como Rússia e China, que, de certa forma, encarnavam a revolução no passado, representam hoje o campo do conservadorismo político, social e intelectual. Essa constatação parece não ter chegado à esquerda brasileira, mas isso é apenas um detalhe.

Uma das importantes conclusões do livro é que nem os ocidentais nem seus aliados são capazes de conduzir a humanidade para fora do labirinto em que ela se perdeu. Isso é verdade, pois nenhuma nação detém todas as virtudes e todas as respostas, muito menos o direito de dominar as outras.

Ele pensa que estaríamos realmente perdidos se acreditássemos que a humanidade precisa de uma nação hegemônica para liderá-la. Estaríamos condenados a torcer pelo que nos maltrata menos, tipo de opção que alguns países como o nosso são forçados a adotar no plano da política interna.

A estupidez de uma guerra mundial pode nos destruir. Mas é uma pena, pois temos grandes problemas comuns, como o combate à emergência climática, e grandes possibilidades de progresso por meio da evolução da medicina genética e mesmo da inteligência artificial, se conseguirmos controlar suas consequências. Apesar de parecer ingênuo, é necessário apostar na paz. Claro que, num confronto mundial, o Brasil, com suas raízes históricas e culturais, é um país do Ocidente e deve ficar ao seu lado.

Mas antes de tudo é necessário investir não só na paz regional no Oriente Médio, como em todos os lugares onde houver conflito. Os fundamentos de nossa política externa nos permitem isso. Há, porém, uma brecha entre os fundamentos e a prática, marcada até agora por frases infelizes e uma visão nostálgica da primeira Guerra Fria. A ideia de que existe democracia relativa na Venezuela ou democracia efetiva na China é apenas resultado de uma visão que não encontra nenhuma base no mundo real.

Na verdade, a democracia não é a única forma de governo. Não se pode universalizá-la com adjetivos, muito menos tentar levá-la a outros países na ponta da baioneta como os Estados Unidos fizeram em muitas ocasiões. O grande esforço intelectual do momento é dissecar todos os elementos de conflito no mundo e neutralizá-los.

Maalouf destaca um deles que contribui enormemente para envenenar o clima político. É o vínculo que estabelece entre religião e identidade, sobretudo nos países de tradição monoteísta. Os conflitos identitários que se baseiam em referências divinas acabam envenenando a História humana. Nesse ponto, há um reconhecimento da longevidade de Confúcio: para ele, o que importava era o comportamento do cidadão na cidade, e não suas preferências metafísicas.

Artigo publicado no jornal O Globo em 22/04/2024

Texto e imagem reproduzidos do site: gabeira com br

Chico Pinheiro ENTREVISTA Guilherme Boulos

A falsa aparência legal do golpe de Bolsonaro

Artigo compartilhado do BLOG DO ORLANDO TAMBOSI, de 22 de abril de 2024

A falsa aparência legal do golpe de Bolsonaro

Se a gente espia os fatos sob o prisma da história brasileira, perceberá que a defesa de Silas Malafaia do ex-presidente no Rio não alivia a barra de Jair Bolsonaro. Diogo Schelp para o Estadão:

Na vigorosa defesa ao ex-presidente Jair Bolsonaro ocorrida neste domingo, 22, na Praia de Copacabana, o pastor Silas Malafaia tentou minimizar a chamada “minuta do golpe”. Ele nem se preocupou em negar a existência do tal papel. Apenas afirmou que se tratava de um “documento sugestivo” apresentado aos militares, perfeitamente amparado na lei. Deixou de dizer, entretanto, que não tem sido incomum aos conspiradores que implantam regimes autoritários se preocuparem com a aparência legal de seus atos. Ocorreu, por exemplo, nos regimes de 1937, com Getúlio Vargas, e em 1964, nossa última ditadura.

“Primeiro, eu quero destruir essa bandidagem de ‘minuta de golpe’, essa safadeza capitaneada pelo grupo Globo e eu vou provar”, bradou Malafaia em seu tom grandiloquente, em cima do trio elétrico, sob aplausos entusiasmados de parte dos 33 mil autodenominados patriotas e pessoas de bem, que estavam pelo local.

Na perspectiva do pastor, Bolsonaro apenas propôs um documento para análise dos comandantes militares sobre Garantia da Lei e da Ordem (GLO), baseado do famigerado artigo 142 da Constituição. Versaria também sobre Estado de Sítio e Estado de Defesa, conforme artigos 136 e 139. “Onde está a ilegalidade dessa potoca?”, perguntou. Pausa para um efeito sonoro percussivo incluído pelo ótimo sonoplasta do evento. Ele mesmo respondeu: “Em lugar nenhum!”.

Carroceria de caminhão com multidão em torno não é um lugar adequado para se debater circunstâncias. Mas alguém poderia ter avisado a Malafaia que, em 1937, Getúlio Vargas conseguiu do Congresso a implantação de um Estado de Guerra como forma de combater uma suposta tentativa de golpe comunista em andamento. O movimento de esquerda que inspirou o golpe, denominado Plano Cohen, foi uma fraude escrita por um militar governista: Olímpio Mourão Filho. Com a aparência legal, o Brasil enfrentou mais oito anos de um regime que flertou com nazifascismo e não tinha pruridos de assassinar, torturar ou deportar os opositores políticos.

O mesmo Mourão Filho, já como general, esteve também envolvido no golpe de 1964. O verniz legal do movimento foi a sessão do Congresso, na madrugada de 1º para 2 de abril, que declarou vaga a Presidência, mesmo com o então ex-presidente João Goulart ainda em território brasileiro, no Rio Grande do Sul. A manobra contou com a anuência e mesmo participação discreta do presidente, à época, do Supremo Tribunal Federal, Ribeiro da Costa, conforme conta Felipe Recondo em seu livro Tanques e Togas (Companhia das Letras).

Dia 21 de novembro de 2013, o Congresso anulou a sessão de 1964 sob protestos do futuro presidente Jair Bolsonaro, assumidamente um apologista da ditadura de 1964. “Isto é mais do que stalinismo, onde se apagavam fotografias. Aqui se estão apagando sessões do Congresso. Pelo menos está servindo para alguma coisa: botar por terra a farsa de que foi um golpe militar a destituição de João Goulart”, disse.

O que podemos concluir disso tudo? Se a gente espia os fatos sob o prisma da história brasileira, perceberá que a defesa de Malafaia não alivia a barra de Bolsonaro. O ex-capitão e ex-presidente apenas repetiu o estilo das conspiraratas brasileiras que nos leva às ditaduras. Busca justificar o injustificável por meio das leis vigentes. Para nossa sorte, em 2022, não deu certo e por isso o ex-presidente corre o risco de passar uma temporada na prisão.

Texto e imagem reproduzidos do blog: otambosi blogspot com 

segunda-feira, 22 de abril de 2024

A volta dos que não foram

Artigo compartilhado do BLOG DO ORLANDO TAMBOSI, de 21 de abril de 2024

A volta dos que não foram

Festejar um José Dirceu e um Eduardo Cunha nos salões de Brasília, depois de tudo o que fizeram para desmoralizar a democracia e as instituições, equivale a fazer troça da República. Editorial do Estadão:

Quando José Dirceu subiu à tribuna do Senado para discursar sobre a democracia brasileira, no último dia 2, o gesto disse muito mais sobre a qualidade do Senado e da democracia do que sobre Dirceu. O prócer petista ganhou tratamento de estadista na Câmara Alta da República duas décadas depois de ter sido escorraçado do Congresso por sua participação ativa no escândalo do mensalão – expressão que resume a corrupção da democracia no País. E ainda teve a oportunidade de dizer que quase não aceitou o convite porque, em outras palavras, o Congresso que o cassou não o merecia. “Zé, é uma honra, para nós, ter você conosco”, disse o senador Randolfe Rodrigues (sem partido-AP), autor do convite a Dirceu a propósito dos 60 anos do golpe militar de 1964.

A soberba do “Zé” tem razão de ser. Perto de alguns dos muitos pigmeus do Senado e da Câmara de hoje, Dirceu é um gigante da sobrevivência política. A prova mais luminosa disso nem foi sua constrangedora participação em uma sessão solene no Senado, de resto feita para louvar aquele que os petistas chamam de “guerreiro do povo brasileiro”, e sim a festança de seu 78.º aniversário em Brasília. Compareceram o presidente da Câmara, Arthur Lira, e políticos de diversas extrações, além de vários ministros de Estado. Todos ali ouviram uma aula magna de Dirceu sobre o projeto de poder lulopetista. Portanto, ninguém pode dizer que não foi avisado.

Mas Dirceu não voltou sozinho do além. Quem andou circulando com enorme desenvoltura em Brasília recentemente foi Eduardo Cunha, cujo mandato de deputado federal foi cassado em 2016 em meio ao escândalo do petrolão e da ofensiva da Lava Jato.

Cunha ganhou a ribalta por ter presidido a Câmara no impeachment da presidente Dilma Rousseff e por ter formado uma bancada pessoal de deputados fiéis, movidos a verbas e cargos negociados pelo poderoso parlamentar. Caiu em desgraça por razões óbvias – de tal modo que 450 deputados votaram pela sua cassação e apenas 10 o apoiaram –, mas, apesar dessa punição acachapante, o ostracismo durou pouco: no dia 11 passado, Eduardo Cunha foi uma das estrelas da festa de aniversário do deputado Marcos Pereira (Republicanos-SP), que reuniu petistas, bolsonaristas e ministros do Supremo Tribunal Federal. Cunha foi até chamado de “presidente” pelo deputado comunista Renildo Calheiros (PE) e saiu a defender o deputado Chiquinho Brazão (sem partido-RJ), acusado de mandar matar a vereadora Marielle Franco.

Já sabemos que a democracia brasileira não anda bem das pernas, seja pelo voluntarismo censório e inquisitorial do Supremo, seja pela captura do Orçamento federal pelos interesses paroquiais de parlamentares, seja pela naturalidade com que o golpismo ganha ares de legitimidade. Mas quando personagens que deveriam ser liminarmente rejeitados pelo mundo político são, ao contrário, recebidos ali como respeitáveis xamãs, constata-se que esse mundo político, já conhecido por seus escassos limites morais, se rebaixou ainda mais, convertido ao credo de que tudo vale – e, pior, de que malfeitos eventualmente abrilhantam biografias, em vez de enxovalhá-las.

Festejar um José Dirceu e um Eduardo Cunha, depois de tudo o que fizeram para desmoralizar a democracia e as instituições, equivale a fazer troça da República, cujo nome é pronunciado em vão por aqueles que a corroem por dentro, tal como as saúvas denunciadas por Mario de Andrade há quase um século. Dirceu e Cunha são os heróis sem nenhum caráter que tão bem representam o ideal político do Brasil de hoje: como Macunaímas atualizados, proclamam a quem interessar possa que não vieram ao mundo para ser pedra, isto é, para se apegar a valores como respeito à moral, às leis e à democracia, e sim para explorar todas as oportunidades que tiverem, sem qualquer peso na consciência, para acumular poder, influência e riqueza. É por isso, e por nenhuma outra razão, que tipos como Dirceu e Cunha são recebidos nos salões de Brasília não com repugnância, e sim com admiração e calorosos tapinhas nas costas.

Texto e imagem reproduzidos do blog: otambosi blogspot com

José Dirceu concede uma entrevista histórica a Reinaldo Azevedo e Walfdrido

segunda-feira, 15 de abril de 2024

Ataque do Irã a Israel reaviva temor de 3ª Guerra Mundial...

Artigo compartilhado do BLOG DO ORLANDO TAMBOSI, de 14 de abril de 2024   

Ataque do Irã a Israel reaviva temor de 3ª Guerra Mundial: o que a impede de ocorrer?

O medo de um conflito mundial é alimentado pela Rússia desde o início de sua agressão contra o território ucraniano, há dois anos, como forma de dissuadir as potências de um envolvimento direto no conflito. Diogo Schelp para o Estadão:

O ataque com centenas de drones e mísseis iranianos contra Israel na madrugada deste domingo, 14, no fuso horário local, colocou combustível na fogueira dos temores de que o mundo pode estar caminhando para mais um conflito global, quase 80 anos depois do fim da 2ª Guerra.

De acordo com esse cenário mais pessimista, uma guerra aberta entre Israel e Irã vai levar a um conflito regional, com envolvimento de diversas nações vizinhas, que obrigaria os Estados Unidos e as potências europeias a dar proteção aos israelenses, de um lado, e a Rússia e a China a apoiar o regime de Teerã, do outro.

A Rússia aproveitaria o caos no Oriente Médio para iniciar uma grande ofensiva na Ucrânia, provavelmente acompanhada de uma incursão na Finlândia para testar a disposição da Otan, a aliança militar do Ocidente, de reagir a um ataque contra um de seus países-membros. Diante de uma ameaça existencial, as nações europeias colocariam suas tropas em confronto direto com os russos, apesar do perigo do uso de armas nucleares por parte do Kremlin.

A existência de dois palcos de guerra em escala regional com múltiplos envolvidos, na Europa e no Oriente Médio, arrastaria as nações de outras partes do globo a se posicionar em um conflito em várias frentes, tendo como pano de fundo a disputa entre dois polos antagônicos de poder, liderados pela China e pelos Estados Unidos.

O medo de uma 3ª Guerra Mundial é alimentado pela Rússia desde o início de sua agressão contra o território ucraniano, há dois anos, como forma de dissuadir as potências de um envolvimento direto no conflito. O governo ucraniano também fala do risco de um conflito global, mas com outro objetivo, o de convencer americanos e europeus da importância de dar mais ajuda militar e financeira ao seu país justamente para evitar o transbordamento da guerra para o restante da Europa.

Nos Estados Unidos, o temor de um conflito mundial é explorado eleitoralmente por Donald Trump para demonstrar a fraqueza e a incompetência do seu adversário, o presidente Joe Biden, na política externa. A esquerda americana, por sua vez, cita a possibilidade de o mundo estar caminhando para uma 3ª Guerra para criticar as operações militares de Israel na Faixa de Gaza.

Muitos historiadores e analistas são céticos quanto ao risco de uma 3ª Guerra Mundial e tratam as menções a esse tema como um alarmismo com fins políticos. Mas o fato é que esse é um cenário que não pode ser descartado pelos estrategistas militares das principais nações interessadas. Em janeiro deste ano, por exemplo, o jornal Bild revelou que o exército da Alemanha chegou a elaborar um relatório considerando as chances de um confronto direto entre as forças da Rússia e da Otan, com o emprego de 30.000 soldados alemães.

A escalada para um conflito de alcance regional no Oriente Médio é tão incerta quanto no caso europeu. Os argumentos para descartar essa possibilidade incluem, primeiro, a avaliação de que os governos dos países envolvidos são atores racionais que não têm interesse em um confronto aberto e direto. E, segundo, que o ataque iraniano deste fim de semana coloca o conflito em um ponto de equilíbrio em que todos ganham.

Sob essa ótica, o ataque do Irã foi só um aviso, uma demonstração da disposição dos aiatolás de reagir com força contra episódios como o bombardeio de uma representação diplomática em Damasco, na Síria, que matou membros da Guarda Revolucionária iraniana, no início de abril.

Politicamente, o Irã ganha porque mostra para sua população que não se dobrou às “provocações” israelenses. Ao mesmo tempo, calcula que a resposta de Israel será moderada, já que o sistema de defesa do país derrubou quase todos os drones e mísseis e não houve mortes. Tanto é assim que, horas após o ataque, o governo iraniano informou que a operação estava encerrada. Israel, por sua vez, avisou que a reação viria “no momento certo”.

O governo israelense ganha em duas frentes com o ataque sofrido neste fim de semana: primeiro, porque demonstra que o Domo de Ferro, seu sistema de defesa antiaérea, consegue proteger a população desse tipo de ameaça — algo importante depois das falhas de segurança que permitiram o sangrento atentado terrorista do Hamas em outubro passado; segundo, porque volta a aglutinar o apoio dos Estados Unidos, que havia sofrido abalos recentes, e da “aliança estratégica e a cooperação regional” contra o Irã, referindo-se a países como a Jordânia e a Arábia Saudita, que mobilizaram suas forças aéreas para interceptar drones iranianos que invadissem seu espaço aéreo.

Mesmo a ideia de que a Rússia pode se ver favorecida por uma escalada no conflito no Oriente Médio é questionável. O Kremlin tem grande influência na região, especialmente no Irã e na Síria, onde mantém bases militares, mas está focado na guerra na Ucrânia, que drena seus recursos bélicos, financeiros e humanos. O Irã tornou-se um importante aliado nessa guerra, principalmente para o fornecimento de armamentos, como os drones.

Um conflito regional no Oriente Médio teria efeitos contraditórios para o ditador Vladimir Putin. Por um lado, desviaria parte da atenção e dos investimentos militares dos Estados Unidos para longe da Ucrânia. Por outro, criaria dificuldades para o próprio esforço de guerra russo.

Tudo depende, porém, dos cálculos que estão sendo feitos em Jerusalém e em Teerã. A verdade é que nunca uma guerra aberta entre os dois países esteve tão na iminência de acontecer.

Texto e imagem reproduzidos do blog: otambosi blogspot com

sábado, 13 de abril de 2024

O politicamente correto ataca...: a liberdade de pensamento e de expressão.

Artigo compartilhado do BLOG DO ORLANDO TAMBOSI, de 8 de abril de 2024

O politicamente correto ataca um direito humano básico: a liberdade de pensamento e de expressão.

A capacidade de se expressar de maneira complexa e argumentada constitui um traço distintivamente humano. Julian Adorney para o Instituto Mises:

O ser humano é um animal dotado da capacidade de raciocinar, imitar e imaginar. Mas não só. Ele é também um animal dotado da capacidade de verbalizar e comunicar suas idéias com o propósito de persuadir seus interlocutores, trocar informações com eles ou, simplesmente, expressar suas emoções.

A capacidade de se expressar de maneira complexa e argumentada constitui um traço distintivamente humano -- o qual, ademais, é em grande medida responsável pelo nosso progresso civilizatório.

Mais ainda: a capacidade de se expressar livremente é o mecanismo por meio do qual o ser humano mantém a sociedade funcionando.

É em decorrência da liberdade de expressão e da capacidade de articular idéias que as pessoas conseguem apontar problemas, explicá-los, solucioná-los e tentar chegar a um consenso.

Mas há o outro lado: a transmissão de idéias também representa um foco potencial de conflitos entre os seres humanos. Um determinado conjunto de idéias -- sobretudo quando estas não fazem parte de nossa identidade cultural -- pode nos parecer rechaçáveis, criticáveis ou mesmo repugnantes. Ou seja, as idéias não só nos seduzem, como também podem nos molestar. E, em ocasiões, podem nos molestar sobejamente.

E isso é inevitável: por ser capaz de pensar e de se expressar, o ser humano sempre poderá soar ofensivo a terceiros.

A evolução se deu por meio do debate aberto

Durante séculos, os indivíduos chegaram ao ponto de se enfrentar mutuamente, até o extremo de se aniquilarem, por causa das idéias. As guerras religiosas foram, em última instância, guerras sobre idéias: sobre concepções heterogêneas (e contrapostas), acerca da transcendência, pelas quais muitos estavam dispostos a morrer e a matar.

A forma que socialmente descobrimos para evitar nos enfrentarmos e nos agredirmos por causa de nossas idéias díspares foi a tolerância mútua: um programa ideológico que politicamente se cristalizou naquilo que hoje chamamos de 'liberalismo' -- "uma tecnologia para evitar a guerra civil", como, de maneira clarividente, definiu o filósofo Scott Alexander.

As idéias liberais nos ensinaram o segredo para podermos conviver em paz: aceitarmos tolerar mutuamente as idéias díspares e incorrermos em argumentações racionais para resolver nossas discordâncias. Foi assim que a civilização evoluiu.

A censura estimula a intolerância

Obviamente, nosso desafio sempre foi tolerar aquelas idéias ou expressões alheias que nos ofendem, e não aquelas que nos agradam e entusiasmam. Somos tolerantes quando respeitamos o dissenso, e não quando recriamos o consenso. E somos mais propensos a tolerar as idéias alheias quando os demais toleram as nossas: se um grupo de pessoas vê suas idéias sendo silenciadas e censuradas, ele perde toda a razão estratégica para tolerar as idéias alheias.

Consequentemente, quando um grupo politicamente influente consegue instituir a censura sobre aquelas idéias alheias que consideram ofensivas, essa ação bem-sucedida começa a atrair imitadores: a tendência natural é que outros indivíduos que também se sentem ofendidos por outras idéias passem a exigir a censura dessas idéias. Como consequência, o debate vai se tornando cada vez mais manietado.

Pior: quando um grupo vê suas idéias sendo censuradas, a tendência é que ele redobre a aposta em suas idéias, tornando-as ainda mais agressivas, podendo se degenerar em violência física.

Assim, qualquer sociedade que opte pela censura, ainda que branda, está continuamente colocando em xeque a resistência de seus pactos implícitos em torno da liberdade de expressão.

Em última instância, a tolerância mútua é, em certa medida, um equilíbrio potencialmente muito frágil: quando um grupo sente que suas idéias já são suficientemente toleradas pelos demais, ele pode, de um lado, se limitar a tolerar as idéias alheias; mas, de outro, pode também cair na tentação oportunista de tentar censurar marginalmente aquelas idéias ou expressões de terceiros que lhes ofendem, causando ainda mais distúrbios.

Esse tem sido o caminho escolhido pelos adeptos do politicamente correto.

O politicamente correto como ferramenta de controle

O adjetivo 'politicamente correto' é usado para descrever linguagens ou ações que devem ser evitadas por serem vistas como 'excludentes' ou 'ofensivas'.

Em tese, o politicamente correto defende a censura de idéias que marginalizam ou insultam grupos de pessoas tidos como desfavorecidos ou discriminados, especialmente grupos definidos por gênero, raça ou preferências sexuais.

No entanto, ao defender a censura de idéias consideradas "ofensivas", o politicamente correto nada mais é do que uma ferramenta criada para intimidar e restringir a liberdade de expressão. Ao proibir a livre manifestação de idéias a respeito de uma miríade de assuntos, o politicamente correto funciona como uma linha de montagem mecanizada, cujo objetivo é padronizar e homogeneizar as ideias dos indivíduos, fazendo-os pensar e agir sempre de modo uniforme.

Para o politicamente correto, um debate aberto e sem censura, além de ofensivo para as minorias, é também subversivo, inflamatório e gerador de discórdias, devendo por isso ser censurado. Mas isso atenta contra a lógica básica. O debate aberto é algo que, por definição, estimula a análise crítica e impede a uniformidade (e a hegemonia) intelectual. O debate aberto e sem censura evita a predominância do chamado "pensamento de manada", garantindo assim uma voz exatamente para os grupos mais marginalizados e excluídos -- os quais, em tese, são o alvo da preocupação do politicamente correto.

Se o indivíduo não mais tiver a liberdade de falar o que pensa, ele não mais será capaz de pensar. Como bem disse o psicólogo Jordan Peterson, a liberdade de expressão é suprema e está acima do "direito" de alguém de não se sentir ofendido. Com efeito, não há o "direito de não ser ofendido" simplesmente porque isso, caso realmente fosse impingido, levaria à extinção do próprio pensamento: o ser humano, por ser capaz de pensar, sempre poderá soar ofensivo a alguém. Querer proibir a expressão do pensamento significa proibir o próprio ato de pensar.

Conclusão (e um teste)

No final, o que temos hoje é apenas uma defesa simétrica da liberdade de expressão: só é lícito aquilo que me agrada. Aquilo que me ofende deve ser proibido.

Só que defender a liberdade de expressão de minhas idéias não é mérito nenhum. Tampouco representa qualquer utilidade social. O verdadeiro mérito está em defender a liberdade de expressão daqueles que nos ofendem profundamente, e então vencê-los no debate por meio da razão. A censura prévia é simplesmente o método a que recorrem os intelectualmente incapazes.

No geral, se você é de esquerda e defende censura e punição àquilo que você considera "discurso de ódio da direita", você está apenas defendendo o privilégio da sua seita de abolir a expressão das idéias alheias. E vice-versa. A universalidade da liberdade de expressão não existe para proteger aquilo que nos agrada, mas sim para proteger da censura aquilo que nos ofende.

Caso cedamos ao encanto de censurar aquilo que nos desagrada, em vez de criarmos uma plataforma que estimule o desenvolvimento do indivíduo por meio do raciocínio lógico, do questionamento e dos diálogos estimulantes, estaremos apenas criando robôs com pensamentos padronizados e homogeneizados.

Abrir a Caixa de Pandora da censura pode acabar estimulando outros grupos a fazerem exatamente o mesmo, acabando assim com a liberdade geral de expressão e com toda a nossa capacidade de debate baseado na razão. Com efeito, estaremos atacando a nossa própria capacidade de raciocínio.

Não há mágica: o livre intercâmbio de informações e idéias é crucial para o progresso de uma sociedade livre. Por isso, toda a forma de "polícia do pensamento" deve ser abolida.

Por fim, um teste: alguns países europeus, como a Alemanha, transformaram em crime o "discurso de ódio" (hate speech) na internet. Na prática, as mídias sociais (Google, Facebook e Twitter) serão severamente multadas caso permitam que seus usuários façam "discursos de ódio" em suas plataformas.

Por uma questão de lógica, isso implica que agora é ilegal odiar Hitler e o Holocausto na internet. Também significa que o marxismo -- que fomenta o ódio dos assalariados aos capitalistas, estimulando o assassinato de capitalistas -- se tornou ilegal. Você apóia?

*Este artigo foi originalmente publicado em 10 de abril de 2019.

Texto e imagem reproduzidos do blog: otambosi blogspot com

Estão mortos os reféns do terrorismo palestino?

Artigo compartilhado do BLOG DO ORLANDO TAMBOSI, de 12 de abril de 2024

Estão mortos os reféns do terrorismo palestino?

Grupo terrorista estaria fingindo negociar com Israel para soltar quarenta reféns, mas pode ser que nem estejam mais vivos. Vilma Gryzinski:

Pelas contas de Israel, 97 reféns estavam vivos e mais 36 tinham morrido – os corpos também valem como moeda de troca. As complexas negociações de cessar-fogo, incluindo Catar e Egito como intermediários, envolviam, numa primeira etapa, a libertação de quarenta reféns, dos quais as catorze mulheres ainda no cativeiro, idosos e doentes. Os demais homens, civis ou militares, ficariam para outra etapa.

Mas tudo parece ter sido negociado de má fé. Fontes americanas que falaram com a CNN, o Wall Street Journal e o Washington Post coincidiram na mesma direção: informações provenientes do Hamas indicam que o grupo terrorista não tem sequer uma lista com quarenta nomes para apresentar.

“Fontes israelenses e americanas calculam, em particular, que o número de mortes pode ser muito maior”, diz a reportagem do Journal.

As fontes da CNN traçaram o seguinte quadro: “O Hamas indicou aos mediadores internacionais, que incluem Catar e Egito, que não tem quarenta reféns vivos” para fazer a primeira troca por palestinos condenados por atos de terrorismo presos em Israel.

Não é impossível que alguns reféns tenham sido mortos nos bombardeios israelenses e outros vitimados por maus tratos, em especial por causa de ferimentos sofridos quando capturados. Hersh Goldberg-Polin, por exemplo, teve metade do braço arrancada por uma granada. Ele estava na rave de música eletrônica atacada em 7 de outubro e foi filmado sendo levado para Gaza, com o grave ferimento.

Alguns reféns feridos foram tratados em hospitais dominados pelo Hamas e a Jihad Islâmica, sofrendo operações sem anestesia. Era um sinal de que o Hamas tinha interesse em mantê-los vivos, como moeda de troca. Isso pode ter mudado.

“EU SOU MAU”

Também corria outra especulação: o Hamas não libertaria as jovens ainda cativas para que não revelassem os abusos sexuais a quem foram submetidas.

O precedente criado por Amit Soussana dá algumas pistas. Ela foi libertada na troca ocorrida em novembro, com mais cem pessoas. Em março, deu um longo depoimento ao New York Times contando como foi obrigada por seu carcereiro, debaixo do murros e com uma arma apontada para a cabeça, a praticar um ato sexual (“Eu sou mau, sou mau, não conte para Israel o que fiz”, lamentou o homem que ela chamava de Mohammad depois do abuso). Ela também foi espancada por outros carcereiros durante uma hora numa espécie de pau de arara improvisado, entre duas poltronas.

Outras reféns libertadas encontraram em diferentes lugares dos cativeiros jovens que contaram ter sofrido abusos múltiplos. Algumas pediram até que isso não fosse contado, para poupar as famílias.

Uma parte dos parentes de reféns se uniu aos manifestantes que protestam contra o governo de Benjamin Netanyahu e culpam o primeiro-ministro por não ter negociado logo a libertação deles. É uma acusação errada, embora perfeitamente compreensível diante do horror de pensar o que é ter uma filha ou irmã no cativeiro em Gaza.

MÁS NOTÍCIAS

As negociações sobre os reféns continuam, mas sem motivos conhecidos para otimismo. A morte dos três filhos e quatro netos de Ismail Hanyeh, líder da ala política que vive no conforto luxuoso do Catar, não ajuda o processo. E, acima de tudo, Israel vive um clima de altíssima tensão pelas ameaças do Irã de retaliar pelo assassinato de seu mais importante representante militar na Síria e no Líbano.

Se o Irã mandar, o Hamas obedece e interrompe qualquer tipo de negociação. E o interesse do Irã no momento é tumultuar o processo. Uma retaliação iraniana, direta ou indireta, levaria Israel a um outro patamar de conflito, obscurecendo até uma causa tão importante para todo o país como a salvação das vítimas capturadas há seis meses.

As declarações em off sobre o destino dos reféns podem ser uma forma de preparar a opinião pública para más notícias. Da mesma forma, está sendo disseminada pela imprensa americana uma onda de informações sobre a iminência de um ataque iraniano. Joe Biden, que tem lamentavelmente deixado a questão dos reféns de lado, usou duas vezes a palavra “inquebrantável” para definir o compromisso dos Estados Unidos com a segurança de Israel.

Se o Irã atacar, Israel vai retaliar a retaliação, conduzindo ao “momento mais perigoso do Oriente Médio desde 1973”, quando houve a Guerra do Yom Kippur, na definição de Marco Rubio, vice-presidente da Comissão de Inteligência do Senado americano, posição em que recebe relatórios secretos dos serviços de inteligência.

O jogo vai ficando muito mais pesado – e os reféns vão perdendo o protagonismo. Uma realidade terrível da dinâmica que passou a vigorar, inexoravelmente, desde o ataque de 7 de outubro do Hamas.

Texto e imagem reproduzidos do blog: otambosi blogspot com

Tabata Amaral, no REconversa

quarta-feira, 10 de abril de 2024

Marcelo Tás ENTREVISTA Tabata Amaral, em Provoca

Como chegamos a esta cidadania de direitos que faz esquecer os deveres?

Artigo compartilhado do BLOG DO ORLANDO TAMBOSI, de 7 de abril de 2024

Como chegamos a esta cidadania de direitos que faz esquecer os deveres?

Nestes 50 anos fomos consolidando um regime de liberdades individuais, estado social e vários tipos de privilégios, e parecemos olhar com surpresa para quem recorda que esses direitos implicam deveres. Patrícia Fernandes para o Observador:

Reza a História que, ao atingir os 18 anos, os rapazes eram sujeitos a um ritual de emancipação que os tornava cidadãos. Com esse estatuto vinha um conjunto de direitos políticos, nomeadamente de participar no governo da cidade, mas, acima de tudo, resultava dele o dever maior de garantir a defesa da cidade. Na medida em que constituíam pequenas unidades políticas, as cidades da antiguidade estavam sob ameaça constante pelo que a preparação militar e a permanente disponibilidade dos cidadãos para as defender ocupava um lugar central na sua organização. É por essa razão que, no momento de inscrição como cidadãos da cidade, os jovens eram sujeitos a uma espécie de treino militar durante dois anos, período conhecido como efebia. Como nos diz Claude Mossé, em O cidadão na Grécia Antiga:

“Este período de dois anos representava a adaptação às realidades da cidade de antigos rituais de iniciação que faziam passar os efebos da adolescência à condição de cidadãos de pleno direito.”

Falamos de Atenas e do período que designamos como clássico ou democrático. Até lá, as cidades gregas eram fundamentalmente aristocráticas e a defesa comum era garantida por uma aristocracia de guerreiros. O caminho para a igualdade política, o mesmo é dizer, para a democracia, passou pela transformação do exército e a sua abertura a outras classes, como a revolução hoplítica demonstra.

A consideração simplista de que a democracia antiga era lacunar porque excluía as mulheres, os escravos e os estrangeiros da cidadania esquece este aspeto fundamental e que Aristóteles deixa claro: a cidadania política resultava daquela disponibilidade, hoje tão fora de moda, de lutar (e morrer) pela cidade. Não era expectável que as mulheres o fizessem em virtude da sua biologia – mesmo em Esparta, onde eram sujeitas a treino militar semelhante ao dos homens, não participavam nos conflitos. Também os escravos estavam dispensados desta disponibilidade, embora o conceito de participação seja aqui mais fluído (podiam ser remadores ou transportar as armas dos seus senhores); mas, em muitas circunstâncias, era-lhes garantida liberdade, e até cidadania, se lutassem. É no que diz respeito aos metecos que aquela regra se torna uma anomalia, como diz George Mavrogordatos, pois tinham o dever de defender a cidade, mesmo sem direitos políticos ou expectativa de os adquirir (embora pudessem, muito excecionalmente, conseguir a cidadania por serviços prestados à cidade).

A relação entre o estatuto de cidadão e a obrigação militar era assim indissolúvel – e não apenas em Esparta, como por vezes se diz. Os gregos sabiam que a sua condição de superioridade – não eram bárbaros – não resultava apenas da sua língua, mas também da sua condição política de verticalidade: eles eram politicamente livres, o que significa que não se vergavam perante um líder, mas sabiam que essa liberdade política só era garantida com a autonomia da cidade e daí resultava a exigência de a defender. É por essa razão que o discurso de Péricles, maioritariamente dedicado ao elogio a Atenas, é, na verdade e essencialmente, um elogio àqueles que morreram por Atenas:

“Tiveram confiança neles mesmos no momento da batalha e ao encontrar-se ante o perigo, sustentados pela esperança ante a incerteza do êxito. Preferiram buscar a sua salvação na destruição do inimigo, e antes na morte que no covarde abandono; assim escaparam à desonra e perderam a vida. No azar de um instante nos deixaram, alcançando o mais alto cume da glória e não a baixa recordação do seu medo. Dessa forma é que se mostraram filhos dignos da cidade.”

Será este o aspeto que mais distancia as sociedades ocidentais do século XXI da tradição de que deveríamos ser herdeiros? É que a relação que se estabelecia então entre o cidadão e a cidade parece exatamente inversa àquela que consagramos nas últimas décadas entre nós. Para os gregos, os seus direitos políticos e a sua forma de vida (nomeadamente enquanto manifestação de religiosidade) só estavam garantidos se a cidade se mantivesse independente, pelo que exigiam a sua defesa. A cidadania era uma dívida que cada cidadão tinha para com a cidade.

Designemos este modelo, em que os deveres prevalecem sobre os direitos, por cidadania de deveres. A ele se oporá um modelo que encontra também as suas raízes na Antiguidade, mas agora no contexto de expansão imperial e, nessa medida, longe do espírito democrático: trata-se da cidadania romana, que consagra um estatuto de privilégios e corresponde, portanto, a uma cidadania de direitos. São duas formas distintas de entender a relação entre o indivíduo e a cidade e compreendem perigos diferentes: o primeiro tenderá a fortalecer a identidade comunitária, podendo exacerbar um espírito nacionalista; o segundo tende a deslassar o conceito de cidadania, que acaba por perder o seu sentido (pensemos no Édito do Imperador Caracala que, ao atribuir a cidadania a todos os homens livres do império, tornou-a irrelevante).

O mais significativo é que estes dois modelos parecem responder a exigências históricas diferentes: o primeiro tenderá a prevalecer em momentos de conflitualidade ou de ameaças militares ou políticas; o segundo acaba por se instalar quando o ar dos tempos se torna mais pacífico e as virtudes públicas perdem valor. É precisamente essa ductilidade que encontramos na evolução do constitucionalismo português, que estabelece o dever de “amar a pátria” e “defendê-la com as armas” na Constituição de 1822, até se transformar numa formulação desprovida de espiritualidade em 1976: “A defesa da Pátria é dever fundamental de todos os portugueses.”

De facto, ao longo dos últimos 50 anos fomos consolidando um regime de liberdades individuais, estado social e diversos tipos de privilégios, e parecemos olhar com surpresa para quem recorda que esses direitos implicam deveres. Assim, tem sido difícil, nos últimos dias, não nos lembrarmos da formulação de Jaime Nogueira Pinto quando nota esta contradição: “Armemo-nos e… ide!”

Como chegamos a esta cidadania de direitos que faz esquecer os deveres? E porque devemos abandoná-la? Essa é a grande vitória de Putin, e debruçar-nos-emos sobre ela na próxima semana.

Texto e imagem reproduzidos do blog: otambosi blogspot com

quinta-feira, 4 de abril de 2024

'1964, O Passado já Passou?', por Fernando Gabeira

Artigo compartilhado do site do GABEIRA, de 1 de abril de 2024  

1964, O Passado já Passou?
Por Fernando Gabeira (in blog)

Acordei bem cedo para ir à Cinelândia, no Centro do Rio. Queria o silêncio e a luz da manhã para gravar sobre 1964. Confesso que, ao ligar a câmera, me veio à cabeça um poema de Mário Quintana: “Quando se vê, já são 6 horas! Quando se vê, já é sexta-feira!”. Quando se vê, passaram 60 anos.

Meus suspiros eram secundários diante do fato histórico e do próprio lugar. Escolhi a Cinelândia, porque estava lá no dia do golpe, mas também porque ouvi tiros vindos do Clube Naval, sabia que a rádio Mayrink Veiga resistia ali perto, e desse lugar partiram também os amigos que foram buscar as armas prometidas, e jamais entregues, pelo Almirante Aragão.

Mais tarde, da Cinelândia, se podia ver a multidão com rosários, marchando com Deus, pela família e propriedade. A sorte estava lançada.

Na Cinelândia aconteceram grandes manifestações da resistência, inclusive a Passeata dos Cem Mil, que levou às ruas artistas como Clarice Lispector, a admirável escritora intimista que não se enquadrava no gênero engajado, tão em moda na época.

As coisas sempre começavam na Candelária e terminavam na Cinelândia, mesmo depois do fim da ditadura. Para abrigar tanta gente, o Comício das Diretas foi na Candelária. Na verdade, esse trecho da Avenida Rio Branco, da Candelária à Cinelândia, foi o palco mais completo de grande parte de nossa História.

Lembro-me daquele período como um tempo marcado pela Guerra Fria. No entanto, com tantas assembleias, debates, manifestações, era um tempo de presença. Sentíamos o cheiro e o calor do outro, daí a grande dor pelos que morreram ao longo dessas décadas.

Hoje, somos imagens luminosas numa tela. Nossa carne e sangue transfiguram-se em bytes; daqui a pouco seremos substituídos por uma réplica que falará como nós. Aquela multidão com rosários disposta a dar ouro pelo bem do Brasil se transformou, foi para a porta dos quartéis, invadiu os prédios dos três Poderes em 8 de janeiro de 2023. Mas as Forças Armadas se recusaram a aderir a uma aventura golpista.

A internet lançou milhões de novos atores na cena política. A agressividade aumentou, brigam as correntes umas contra as outras, brigam contra quem não quer brigar, brigam contra quem briga mais levemente.

Análises políticas mais elaboradas são uma atividade de risco. Apanha-se de todo lado. Mas, felizmente, a descoberta do Brasil, com seus recursos naturais, é uma conquista relativamente nova, dos tempos de crise ecológica.

Não voltamos a 1964, dificilmente voltaremos. Apesar do tom sombrio dos debates, do tsunami de fake news, do crescimento da extrema direita, de governos autoritários ao redor do mundo, da própria hipótese da ruína da democracia americana, da volta do Trump, tudo isso não responde às necessidades de uma época ameaçada pela destruição ambiental e pela desigualdade de renda.

O fato de não voltarmos, creio eu, nos ajuda a lembrar 1964. E isso não tem nada a ver com radicalismo. É possível revisitar uma época e usá-la para avançar o diálogo no presente.

A Guerra Fria acabou, mas os corações, principalmente os fígados, não abandonam o estado bélico. Novos temas entraram em cena para inflamar os ânimos: a imigração no Norte, a violência urbana e corrupção em países do Sul.

Não há nada, no entanto, que não possa ser discutido e resolvido num clima de paz e liberdade. Aliás, esse é o fundamento de nossa política externa, é o traço singular da visão brasileira do mundo.

Precisamos ser o que escrevemos que somos. Nossa habilidade em pacificar conflitos pelo mundo vai por água baixo se não demonstrarmos aqui o que prega a sabedoria mineira: as ideias brigam, as pessoas não.

Artigo publicado no jornal O Globo em 01/04/2024

Texto e imagem reproduzidos do site: gabeira com br

segunda-feira, 1 de abril de 2024

‘Foco na desigualdade é coisa de invejoso; o importante é reduzir a miséria’

Entrevista compartilhada do BLOG DO ORLANDO TAMBOSI, de 30 de março de 2024

Rainer Zitelmann: ‘Foco na desigualdade é coisa de invejoso; o importante é reduzir a miséria’.

Para o pesquisador, o que leva à queda sustentável da pobreza não são ações governamentais de redistribuição de renda nem programas internacionais de ajuda, mas o crescimento econômico, que prospera nas economias de livre mercado e em sociedades que veem os empreendedores de sucesso como modelo e não como bode expiatório. Entrevista a José Fucs, do Estadão:

O historiador e sociólogo alemão Rainer Zitelmann, de 66 anos, faz parte de uma estirpe rara de intelectuais, que concentra seus estudos nos benefícios do capitalismo para o desenvolvimento e a redução da miséria e não nos males que o sistema supostamente causa para a sociedade, como a maioria de seus pares.

Autor do livro O capitalismo não é o problema, é a solução (Ed. Almedina), publicado no Brasil em 2022, ele acabou de lançar uma nova obra que aborda os efeitos positivos gerados pela liberdade econômica no desenvolvimento e na redução significativa da miséria no mundo nos últimos 40 anos. O novo livro – cujo título em português será Como as nações superam a pobreza – deverá ser lançado no País em junho pela mesma editora.

Nesta entrevista ao Estadão, realizada por e-mail e complementada por videoconferência, Zitelmann fala sobre a preocupação crescente com o aumento da desigualdade social e sobre o trabalho produzido pelo economista francês Thomas Piketty, apresentado em detalhes no livro O capital no século 21, lançado em 2014, que se tornou uma referência internacional no assunto. “O que representou, na interpretação de Piketty, o pior momento (em termos de desigualdade) foi, na verdade, o melhor momento da história da humanidade, porque a pobreza nunca caiu tão rapidamente quanto nas últimas décadas”, afirma. “Eu estou interessado na pobreza e não na desigualdade. O foco na desigualdade é coisa de gente invejosa.”

Segundo Zitelmann, as sociedades que têm uma atitude positiva em relação aos empreendedores bem-sucedidos alcançarão o sucesso de forma mais consistente do que as que usam os ricos como bodes expiatórios. Confira a seguir sua entrevista ao Estadão.

Em seu novo livro, o sr. afirma que a liberdade econômica – e não as ações governamentais de redistribuição de renda e os programas internacionais de ajuda – é que promove a redução da pobreza no mundo. O que o leva a dizer isso?

No meu livro, eu menciono vários estudos científicos que chegaram à mesma conclusão nas últimas décadas. A ajuda ao desenvolvimento é, na melhor hipótese, ineficaz, e muitas vezes até contraproducente. Podemos observar isso na África: nenhum continente recebeu tanta ajuda para o desenvolvimento como a África. Mas as pessoas lá ainda são extremamente pobres. Os países asiáticos não receberam tanta ajuda. Seguiram um caminho diferente, permitindo mais liberdade econômica. Veja os casos da Coreia do Sul, de Taiwan, de Cingapura e mesmo de países que se autodenominam socialistas, como a China e o Vietnã. Eles fizeram enormes progressos na luta contra a pobreza com a liberalização de suas economias.

O sr. pode dizer de que forma a liberdade econômica beneficia os mais pobres? Isso não é mais uma crença ideológica do que uma conclusão baseada em fatos e na realidade?

Eu sou historiador e sociólogo. Para mim, apenas os fatos contam. Eu olho para a história para ver o que funciona e o que não funciona. Antes do surgimento do capitalismo, há 200 anos, 90% da população mundial viviam na pobreza extrema. Hoje, menos de 9% vivem na miséria. Na China, 45 milhões de pessoas morreram entre 1958 e 1962, em decorrência do “Grande Salto Adiante” implementado por Mao Tsé-Tung (1893-1976), que foi a maior experiência socialista da história. Na época da morte de Mao, 88% da população chinesa viviam na extrema pobreza. Depois, veio o Deng Xiaoping (1904-1997), que introduziu a propriedade privada e implementou a economia de mercado no país. Ele disse: “Deixem algumas pessoas ficar ricas primeiro”. Resultado: o número de pessoas vivendo na miséria na China hoje representa menos de 1% da população.

Como exatamente a liberdade leva à redução da pobreza e aos resultados que o sr. mencionou?

Liberdade econômica significa deixar os empreendedores fazerem seus negócios, ganharem dinheiro, ficarem ricos. Quando há liberdade na economia, o resultado é o crescimento, que é a única forma de reduzir a pobreza. Isso é o que muita gente não entende. Não é que o governo não precise fazer nada. Mas, se o governo não estiver tão envolvido nas coisas e deixar os empreendedores decidirem o que produzir e os consumidores, o que consumir, a economia vai ganhar dinamismo, o país vai crescer e a pobreza vai diminuir.

Muita gente defende a ideia de que a redistribuição de renda é essencial para reduzir a miséria e diz que a economia de livre mercado leva a mais desigualdade. Em sua avaliação, a redistribuição de renda não é uma forma de amenizar as dificuldades dos mais vulneráveis?

Vou continuar no caso da China para responder a esta pergunta: sim, a desigualdade hoje é maior do que era nos tempos de Mao. Não havia bilionários na China naquela época. Hoje, há mais bilionários na China do que em qualquer outro lugar do mundo, exceto nos Estados Unidos. Você acha que os chineses querem voltar aos tempos de Mao, porque havia mais igualdade naquela época? Durante minhas conversas na China, não encontrei ninguém que quisesse isso. Eu estou interessado na redução da pobreza e não na desigualdade. O foco na desigualdade é coisa de gente invejosa.

No livro “O capital no século 21″, publicado em 2014, o economista francês Thomas Piketty mostra, com base em dados históricos, que houve um grande aumento da desigualdade no mundo nas últimas décadas, e faz críticas duras a esta situação. Qual a sua opinião sobre o trabalho e as ideias de Piketty a respeito do questão da desigualdade?

As teses de Piketty foram refutadas muitas vezes. Muitos dos números que ele usa estão simplesmente errados, como já foi provado repetidas vezes. Mas, mesmo que estivessem corretos, o que isso significaria? Ele diz, em primeiro lugar, que a desigualdade diminuiu durante a maior parte do século 20 . Aí, a partir da década de 1980, veio o que ele considera como um momento ruim, quando a desigualdade aumentou. Mas o que, na interpretação de Piketty, representou o pior momento foi, na verdade, o melhor momento da história da humanidade, porque a pobreza nunca caiu tão rapidamente como neste período. Nas últimas décadas, desde o fim do comunismo na China e em outros países, o declínio da pobreza ocorreu num ritmo inédito na história. Em 1981, 42,7% da população mundial viviam na pobreza absoluta. Em 2000, o índice havia caído para 27,8% e hoje é inferior a 9%. Então, como você poder ver, tudo depende do foco, a desigualdade ou a pobreza, na análise da questão.

O sr. afirma que, nos últimos 40 anos, US$ 568 bilhões fluíram para África sem efeitos positivos e sustentáveis na redução da pobreza. Com base no que o sr. diz isso? As ações realizadas com esse dinheiro todo não ajudaram os mais pobres na África?

Não. Sabemos disso pelos estudos que eu menciono no livro. A maior parte do dinheiro vai para os chamados “projetos”, que às vezes até melhoram as coisas no curto prazo, quando os recursos estão entrando. Mas, quando o dinheiro para de entrar e os projetos chegam ao fim, tudo volta a ser como antes. Além disso, grande parte do dinheiro fica nas mãos de elites corruptas. Então, a ajuda para o desenvolvimento não é uma forma de combater a pobreza. É uma forma de manter governos corruptos na África, com recursos fornecidos pelos pagadores de impostos americanos e europeus. Muito desse dinheiro vai também para as ONGs que desenvolvem os projetos. Elas precisam crescer, para manter o grande número de pessoas que empregam, e estão muito felizes com os relatórios que produzem, a burocracia que produzem. Estão interessadas principalmente na própria sobrevivência.

No seu livro, o sr. usa os casos do Vietnã e da Polônia como exemplos de países que reduziram de forma significativa a pobreza nos últimos 20 ou 30 anos, após a liberalização de suas economias. Na prática, como a liberalização ajudou estes países a reduzir a miséria?

Em 1990, o Vietnã era o país mais pobre do mundo. O que a guerra não destruiu, a economia planificada socialista destruiu. O PIB (Produto Interno Bruto) per capita era de US$ 98, inferior até aos US$ 130 da Somália. Mas, com as reformas pró-mercado lançadas pelos vietnamitas no fim da década de 1980, o número de pessoas vivendo na pobreza extrema caiu de cerca de 80% da população para 5%. A Polônia, na década de 1980, era um dos países mais pobres da Europa. Depois, com as reformas que abriram caminho para a economia de mercado, a Polônia se tornou a campeã de crescimento na Europa por três décadas seguidas e as condições de vida da população melhoraram muito.

Por que o sr. escolheu o Vietnã e a Polônia como exemplos para o seu livro? O que eles fizeram de diferente que os levou a ter resultados positivos na redução da miséria?

Todos os anos, desde 1995, a Heritage Foundation, dos Estados Unidos, publica o Índice de Liberdade Econômica , que mostra o quão livre é um país do ponto de vista econômico. Eu analisei todos os 177 países da lista para ver onde tinham ocorrido os maiores ganhos em liberdade econômica. E em nenhum outro país de dimensões equivalentes a liberdade aumentou tanto quanto na Polônia e no Vietnã. Isso me deixou curioso. Aliás, o índice de 2024 acabou de ser publicado e o Vietnã ganhou 13 posições em relação a 2023, subindo da 72.ª para a 59.ª posição, num momento em que a liberdade econômica se deteriorou em quase todo o mundo. Isso só confirma minha análise. Tive também uma ligação pessoal com os dois países, porque as duas mulheres com quem tive as relações mais longas da minha vida vieram da Polônia e do Vietnã.

Os dois países, o Vietnã e a Polônia, tinham uma economia planificada antes da liberalização, na qual o Estado controlava quase tudo, inclusive os preços dos bens e serviços. Muita gente acredita que a vida das pessoas era melhor naquela época. O que o sr. pensa sobre isso?

No meu livro, eu conto várias histórias sobre a vida cotidiana das pessoas no Vietnã e na Polônia. Conto a história de crianças que tinham de esperar horas na fila só para conseguir arroz – e, mesmo assim, não recebiam o suficiente para saciar a elas e a suas famílias. Considerando que os salários mensais das pessoas eram suficientes apenas para garantir as despesas de subsistência de uma semana, quase todo mundo tinha de encontrar fontes adicionais de ganho para compensar a escassez. Em Hanói, era comum as famílias usarem um cômodo de seus apartamentos para criar porcos. A criação de porcos era a melhor fonte de rendimento extra que havia e a maioria das famílias destinava um quarto em um apartamento de três quartos para os porcos, tendo de conviver com o barulho e o mau cheiro, em condições de higiene terríveis.

No caso da Polônia, a situação era semelhante?

Na Polônia, acontecia a mesma coisa. As pessoas tinham de esperar horas e horas nas filas – e algumas vezes até dias – para comprar coisas para o seu dia a dia. Muitas até pagavam para outras pessoas ficarem para elas na fila. E, quando chegava a vez delas, acabavam comprando coisas que nem precisavam, porque não sabiam se iriam faltar depois. De repente, elas podiam até trocar esses produtos por outros, com outras pessoas. As longas filas eram muito típicas do socialismo. Na Polônia, havia também selos para comprar certos produtos que tinham oferta limitada. Se você perdesse o selo, tinha de fazer uma dieta, porque não podia repor. Estes são os melhores exemplos de que o sistema não funcionava – e isso não aconteceu nos anos 1950 e 1960, no pós-guerra, mas nos anos 1980.

Nestes países, eu falei com muitas pessoas e também fiz muitas entrevistas. Não queria que meu livro fosse apenas cheio de números, embora ele tenha muitos dados. Queria que as pessoas tivessem uma palavra a dizer e falassem sobre suas vidas naquela época e agora. E, como no caso da China, não conheci ninguém no Vietnã e na Polônia que quisesse voltar aos tempos da economia socialista.

No caso da Polônia, o país conseguiu unir a liberdade econômica com a democracia. Já o Vietnã manteve o sistema autoritário de partido único que também se mantém na China, em Cuba e na Coreia do Norte. De que forma isso influenciou o desenvolvimento econômico e a redução da pobreza nos dois países?

No Vietnã, em razão do regime de partido único, as reformas econômicas foram mais fáceis de implementar do que na Polônia. É preciso compreender que, num primeiro momento, as reformas tendem a piorar as coisas. Na Polônia, não foi diferente. O desemprego, por exemplo, que era camuflado nos tempos do comunismo, ganhou visibilidade. Numa democracia, durante o período de transição, os meios de comunicação social e os partidos politicos que se opõem à liberalização da economia incitam as pessoas contra as reformas e defendem mais intervenção estatal. É exatamente isso que estamos vendo agora na Argentina, após a eleição de Javier Milei para a presidência.

O sr. poderia dar um exemplo de um país rico que empobreceu com a implantação de um regime socialista, supostamente destinado a promover a redução da desigualdade e da miséria?

Um exemplo emblemático é a Venezuela. Nos anos 1970, a Venezuela era um dos países mais ricos do mundo. A Venezuela era uma boa democracia, com uma economia de mercado dinâmica, e as pessoas tinham um bom padrão de vida. Aí, com a ascensão do Hugo Chávez (1954-2013), tudo mudou. Os primeiros dois ou três anos nem foram tão ruins, porque ele teve a sorte de os preços do petróleo estarem em alta no mercado internacional, garantindo recursos para bancar as ações sociais. Mas aí o Chávez começou com as nacionalizações, os preços do petróeo caíram e as coisas se deterioraram rapidamente. Mais de 25% da população da Venezuela, o equivalente a 7,5 milhões de pessoas, fugiram do país desde então. Se isso pôde acontecer num país como a Venezuela, pode acontecer em qualquer lugar.

Quando as coisas chegam no ponto em que chegaram na Venezuela, a insatisfação da população não acaba levando a uma mudança no quadro?

Algumas pessoas pensam que as coisas tem de se tornar muito, muito ruins para surgir uma boa solução, mas isso não é verdade. A história não é um filme de Hollywood com garantia de final feliz. As coisas também podem se tornar piores, como aconteceu na Alemanha nos anos 1930, quando Adolph Hitler chegou ao poder. Ninguém podia imaginar que algo terrível iria acontecer, mas aconteceu. Com o Hugo Chávez, foi a mesma coisa. Eu me lembro que os intelectuais de esquerda da Europa e dos Estados Unidos estavam entusiasmados com o tal socialismo do século 21 defendido pelo Chávez, porque finalmente tinham um exemplo de uma nova utopia, já que na Coreia do Norte as coisas não funcionaram tão bem como eles imaginavam. Mas, no fim, o resultado na Venezuela foi o pior possível. O caso da Venezuela é um aviso de que as nações também podem se tornar mais pobres.

Além da Venezuela, que outro caso o sr. citaria de um país que era rico e empobreceu, em decorrência de uma maior intervenção do Estado na economia, da perseguição aos ricos e da implementação de uma política de distribuição de renda?

Outro exemplo que ilustra bem este fenômeno é a Argentina. Muita gente não sabe, mas a Argentina também já foi muito rica. Há cem anos, a Argentina era um dos países mais ricos do mundo, tanto quanto os Estados Unidos. Aí eles começaram com essa política peronista de redistribuição de renda e deu no que deu, com um aumento considerável da pobreza ao longo do tempo. De um lado, eu tenho dúvidas hoje se as pessoas terão um ou dois anos de paciência para esperar os efeitos positivos das reformas que estão sendo implementadas pelo Milei. Como eu disse há pouco, a experiência da história mostra que algumas coisas ficam piores no começo. O desemprego cresce e às vezes há até recessão. Mas elas foram pacientes o suficiente para esperar 80 anos para mudar, vendo a situação do país se deteriorar cada vez mais, desde 1945. Com exceção da década de 1990, a Argentina teve inflação de dois dígitos em todos os anos. Era algo normal para eles.

O sr. afirma que, em geral, os ricos são “demonizados” e não admirados em quase todo o mundo. São vistos como “exploradores " dos pobres por muitas pessoas, especialmente pelos intelectuais. Mas, na sua visão, ter uma atitude positive em relação aos ricos e ao capitalismo é algo que favorece o desenvolvimento e a redução da miséria. O que a atitude das pessoas em relação aos super-ricos tem a ver com a diminuição da pobreza?

Eu realizei uma pesquisa sobre a imagem dos ricos em 13 países. A inveja social dos ricos é mais acentuada na França e em seguida na Alemanha. Já os poloneses e os vietnamitas têm uma atitude positiva em relação aos ricos. A Universidade de Comércio Exterior de Hanói até me convidou para participar de um curso sobre o preconceito contra os ricos e o que é possível fazer contra isso. Não consigo imaginar uma universidade na Europa ou nos Estados Unidos realizando um workshop como esse. As sociedades nas quais as pessoas consideram os empreendedores bem-sucedidos como modelo alcançarão o sucesso de forma mais consistente do que as que veem os ricos como bode expiatório. Quando há pessoas que querem ser ricas e têm possibilidade de se tornarem ricas, as coisas funcionam. Recentemente, escrevi um livro sobre o ódio aos ricos no Chile, junto com o economista chileno Axel Kaiser, chamado El Odio a los Ricos (O ódio aos ricos). No livro, nós mostramos que os problemas no Chile, que era o país mais liberal e mais bem-sucedido da América do Sul, começaram com uma campanha contra os ricos.

Muitas pessoas acreditam que os mais ricos enriquecem à custas dos mais pobres, em linha com as ideias propagadas por Karl Marx. Qual a sua visão sobre esta questão?

No coração das crenças de todos os socialistas, há esta ideia de soma zero, de que os ricos só se tornam ricos porque tiram dinheiro dos pobres. Mas eu sempre pergunto: como explicar que, na China, por exemplo, o contingente de pessoas vivendo na miséria caiu de quase 90% para 1% da população em 40 anos, enquanto o número de bilionários aumentou de 0 para 600? Não é lógico. Isso aconteceu no mundo inteiro. A população mundial vivendo na pobreza extrema passou de 43% do total em 1980 para 9% hoje, enquanto o número de bilionários aumentou de 500 para 2.700. A razão que leva à redução da pobreza e torna algumas pessoas muito ricas é a mesma: o crescimento econômico. Este é meu principal argumento contra o pensamento de soma zero. Essas pessoas pensam a mesma coisa em relação ao mundo: que os países ricos têm de dar dinheiro para os pobres, para eles melhorarem sua situação. Também é um tipo de pensamento de soma zero. Elas não entendem que não é assim que funciona.

Na China, o presidente Xi Jinping e o Partido Comunista começaram a falar há alguns anos sobre “prosperidade comum”, em razão do aumento do número de bilionários e do crescimento da desigualdade. Isso levou também o regime a adotar medidas para controlar mais a livre iniciativa e estimular as doações e a redistribuição de renda. Qual a sua avaliação sobre esta questão?

Em 2019, um relatório de trabalho do Fórum Económico Mundial afirmava que “o setor privado da China – que vem se recuperando desde a crise financeira global de 2008– agora é o principal motor do crescimento econômico do país”. O relatório mencionava também a combinação dos números 60, 70, 80 e 90, que é frequentemente utilizada para descrever o papel do setor privado para a economia chinesa. O setor privado chinês contribui com 60% do PIB do país e é responsável por 70% da inovação, 80% da mão de obra urbana e 90% dos novos empregos. A riqueza privada também é responsável por 70% do investimento e 90%das exportações.

A ascensão da China resultou totalmente da introdução da propriedade privada e das reformas capitalistas que fizeram recuar a influência do Estado. Nos últimos anos, contudo, a tendência começou a se inverter. O Estado voltou a interferir muito mais na economia e isso já levou a um abrandamento do crescimento econômico chinês.

Na sua opinião, o que pode ter um impacto negativo no combate à pobreza e na melhoria da qualidade de vida da população mundial nas próximas décadas?

O esquecimento das pessoas. Vemos isso acontecer em todos os lugares. Depois de um tempo, as nações esquecem por que tiveram sucesso. Acabei de dar o exemplo da China, mas há muitos outros. Durante anos, em quase todo o mundo, os países estão indo na direção de uma economia mais planificada. Os socialistas, hoje, controlam quase toda a América Latina – a vitória de Javier Milei é a única exceção em anos. Os Estados Unidos e a Europa também estão caminhando cada vez mais para uma economia planificada. No seu grande discurso em Davos, em janeiro, o Milei enfatizou que, em geral, o socialismo moderno já não promove a nacionalização dos meios de produção. Segundo ele, isso não é mais necessário. O mercado livre está sendo cada vez mais sufocado pela intervenção governamental na economia, pela regulamentação cada vez maior, pelo aumento da tributação e pelas políticas dos bancos centrais. Os meios de produção e os ativos imobiliários até podem continuar a ser considerados como propriedade privada no papel. Mas só os títulos formais de propriedade se mantêm, porque os supostos proprietários perdem cada vez mais o controle sobre seus ativos, na medida em que o Estado é que lhes diz o que fazer (e o que não fazer) com eles.

Texto e imagem reproduzidos do blog: otambosi blogspot com