sexta-feira, 13 de abril de 2018

Nunca antes na história deste país (Artigo de Antônio Prata)

Imagem reproduzida do site: folha.uol.com.br/colunas/antonioprata

Nunca antes na história deste país

Artigo de Antônio Prata/Folha de S. Paulo

Me sinto agachado numa trincheira entre o tiroteio dos que acreditam que a prisão do Lula é um complô dos brasileiros ricos com a CIA e o Moro para entregar nossas minas de nióbio ao capital estrangeiro e os que têm certeza absoluta de que o Lula é a encarnação do mal e que sua prisão representa um momento ensolarado da nossa história, sinal de que caminhamos a passos largos para um futuro virtuoso.

Qualquer um que tome um destes dois lados está, como se diz por aí, ou mal informado ou mal-intencionado. Ou ambos.

Tom Jobim disse que o Brasil não era para principiantes. A realidade, de 2013 para cá, prova que o Brasil não é nem sequer para iniciados. Vamos levar alguns anos, talvez muitos, para entender o sentido do que está se passando.

Os acontecimentos são ambivalentes, polivalentes, contraditórios. Lula foi de longe o melhor presidente que este país já teve e foi condenado porquê de fato recebeu de presente um apartamento de uma empreiteira que desviou rios de dinheiro público e despejou parte desta fortuna nos cofres do PT.

A Lava Jato é um avanço indiscutível num país em que a impunidade é a regra e a Lava Jato é parcial e atropela direitos.

É preciso ser um avestruz e enfiar a cabeça na própria bolha do Facebook para não aceitar todas essas afirmações como verdadeiras.

"Acreditamos que éramos como Mané Garrincha"

A eleição do Lula foi um sopro de esperança num país que, desde sempre, foi governado pela mesma meia dúzia, para a mesma meia dúzia.

Houve um momento na década passada em que todos, mesmo aquela meia dúzia (que, aliás, continuou governando ao lado do Lula), acreditamos que o Brasil ia dar certo.

Que éramos como Mané Garrincha, apesar das nossas pernas tortas, por causa de nossas pernas tortas, sairíamos driblando como ninguém.

Lula era o protótipo do sonho brasileiro, o self-made-man tupiniquim vindo da miséria em Garanhuns e eleito presidente, o personagem mais brasileirissimamente hollywoodiano que este país já produziu.

E milhões saíram da miséria. E milhares conseguiram bolsas em faculdades. E a economia cresceu. E roubou-se a torto e a direito.

Roubou-se como nunca antes na história deste país? Impossível saber, porque antes não se investigava.

"Self-made-man tupiniquim vindo da miséria em Garanhuns"
Veja como é contraditório: Lula só foi preso porque deixou que o Ministério Público e a Polícia Federal agissem sem amarras, como nunca antes na história deste país!

Mas o fato de que sempre se roubou não legitima a roubalheira do PT. E haver roubalheira no PT não deslegitima tudo de bom que o PT fez. Não foi pouco —nem o que fez de bom, nem a roubalheira. O Brasil não é para principiantes. Nem para iniciados.

Logo após vencer as eleições de 2002, Lula disse que a esperança venceu o medo. Com toda a corrupção revelada pela Lava Jato, com o desastre econômico do governo Dilma e a hábil orquestração dos abutres que agora estão no poder, lavando todos os seus pecados nas águas do antipetismo, o medo está de volta. A prisão do Lula é a prova definitiva de que aquela esperança morreu.

Viva a esperança!

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2 comentários:

 Adriana Garófolo disse...

Com exceção do comentário de q Lula seria o melhor presidente, o texto expressa muito bem um monento histórico, q merece profunda reflexão. Uma dualidade de sentimentos, pautados em fatos pouco verídicos, quase q como uma esquisofrenia social. Por um lado, quem acredita q Lula é o salvador, um novo Cristo. Por outro, quem crê q ele é a besta. Na vdd, um ser humano, que se desviou de seus principios, quer seja por personalidade fraca ou por carater duvidoso, nunca saberemos.

celsolungaretti disse...

Quais princípios, Adriana? As duas influências mais fortes que ele sofreu foram as dos caciques políticos do Nordeste e do sindicalismo de resultados. Não são escolas de bons valores éticos.

Mas, os outros políticos profissionais sempre foram iguais ou piores. Dou razão a seus defensores neste ponto: punem-no pelo que outros fazem da mesmíssima maneira sem que o mundo lhes desabe na cabeça.

O que me choca muito é terem-no convertido numa espécie de Padim Ciço do ABC. Trata-se de uma visão eminentemente religiosa, maniqueísta, medieval.

Nada a ver com o Lula real, que tive oportunidade de entrevistar durante uma hora no começo da campanha de 1989 e, francamente, não me impressionou. O carisma de um sindicalista não dizia muito para quem convivera com os combatentes da luta armada. E notei que ele ficou um pouco desconcertado quando conduzi a entrevista como jornalista, e não como fã. Estava acostumado com jornalistas que, diante dele, se comportavam como fãs.

Marxistas analisamos os seres humanos, em si contraditórios, em interação permanente com as contradições de seu momento histórico. Ninguém é totalmente bom, nem totalmente ruim. Somos o que fazemos de nós ao responder aos desafios que surgem em nosso caminho.

Fico pasmo em ver o ambiente de adoração que cerca o Lula. Meu reino não é ESSE mundo. Se eu quisesse cultuar homens santos, iria num templo.

Quem está na política profissional, conforme a frase lapidar do Jean-Paul Sartre, acaba mergulhando as mãos no sangue e nos excrementos.

Como ser humano, tenho pena do Lula, foi alçado muito acima de seus limites e, claro, quebrou a cara. A culpa foi de quem, oportunisticamente, o colocou nessas alturas.

Como personagem histórico, considero-o nocivo, uma âncora prendendo a esquerda a um passado que nem sequer foi bom. Espero que ela agora acorde de seu transe e volte à luta para a construção de um futuro melhor. Nossa caminhada tem de ser pra frente, o populismo não é resposta para nada em pleno século 21.

Abs.
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Artigo e comentários reproduzidos do blog: naufrago-da-utopia.blogspot.com.br

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